A SPA em 2015 atribuiu ao arquitecto Álvaro Siza o Prémio Vida e Obra de Autor Nacional. Nessa ocasião o arquitecto proferiu o seguinte discurso que reproduzimos na íntegra.
"É com emoção e orgulho que recebo o prémio que me é concedido pela Sociedade Portuguesa de Autores, instituição que desde há quase cem anos defende o Direito de Autor, o Património, os valores culturais.
Estou profundamente grato; mais ainda por encontrar neste Prémio um significado que ultrapassa o que é pessoal, interessando à Arquitectura e aos seus intérpretes em geral.
Nunca, que eu recorde, se prestou tanta atenção à Arquitectura e aos arquitectos. Parece ser este um momento promissor.
Contudo nunca, que eu recorde, foi tão evidente o não reconhecimento e a limitação dos Direitos e Responsabilidades do Arquitecto, aparentemente no intuito de o remeter à condição de especialista – um especialista mais, com funções específicas, limitadas, redutoras.
Pode parecer sem sentido ou exagerado o que digo. Julgo que não é.
Esteve recentemente em apreciação na Assembleia Nacional uma proposta de alteração, segundo a qual aos arquitectos não seria permitido coordenar e fiscalizar projectos e obras. A proposta não passou. Mas a ameaça mantém-se e não só em Portugal.
O arquitecto não é “um especialista mais”. Não é um fazedor de imagens, como por vezes se pretende.
Em tempo de interdisciplinaridade compete-lhe sobretudo promover e coordenar a convergência das muitas competências que a construção de uma “obra de qualidade” envolve – objectivo não atingível por espontânea adição de saberes simultaneamente autónomos e ajustáveis.
É dessa forma que o arquitecto é o autor, o responsável por uma arquitectura assumida como serviço social e valor cultural, não apenas como valor mercantil.
Uma arquitectura desenvolvida em equipa, que persegue a Beleza não como tique elitista mas como garante de eficácia absoluta, liberta do temporário e do específico: a eficácia que interessa.
O Prémio que me é concedido distingue a carreira de um autor. É um claro sinal, num tempo em que, para o arquitecto, o Direito de Autor contempla – tenuemente – o projecto, e não defende a integridade de uma obra - a “coisa real”, o que surge e irá surgindo na Cidade. Preocupa-me essa ameaça à leitura contínua da História, quotidiana e em presença, no que à Arquitectura e à sua evolução respeita.
Neste contexto, de algum modo, o significado de um Prémio concedido pela Sociedade Portuguesa de Autores devolve aos arquitectos a esperança: a vontade de resistir.
A minha gratidão."
Porto, 25 de Maio de 2015
Álvaro Siza
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